Papa Bento VXI - Maio/2007

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Não O sinto, logo Ele não existe?


Em Agosto passado surgiu uma notícia quase explosiva: Madre Teresa de Calcutá experimentou o silêncio e a ausência de Deus. Algumas vozes ridicularizaram o fato de ela estar a caminho dos altares. Outras diziam: "Como pôde duvidar de Deus se ela não se cansou de fazer o bem?"

Madre Teresa não duvidava da existência de Deus. Em nenhuma das suas cartas, pelo que parece, ela escreve nesse sentido. O que aconteceu é que ela não sentiu, durante muito tempo, um Deus que lhe falasse, que lhe desse soluções para os seus problemas. A única forma como Deus Se expressava era através dos mais pobres com quem ela consumia o seu tempo. Era um Deus ausente na intimidade da oração, mas presente nas chagas de um doente.
Muitas vezes, perante os pobres, os doentes, as vítimas de discriminação e das guerras, gritamos revoltados contra Deus: «Onde estás? Porque nos abandonas?» Foi esta a experiência de Madre Teresa: Deus relacionava-se com ela no silêncio, no sofrimento. Era assim como um amigo que realmente a amava, mas que ela não O via, e isso não queria dizer que Ele deixou de existir ou de lhe querer bem.

Amor exposto no sofrimento

O livro agora publicado revela que Madre Teresa não teve crises mas sim provas de fé. Era um sentimento de uma sede de Deus, de desejar uma maior consolação, uma maior profundidade na sua relação com Ele. Isso era o que a trazia insatisfeita.
Segundo o autor do livro Vem ser a minha luz, que publica as cartas de Madre Teresa, ela vivia numa união com o Jesus do monte das oliveiras, o Jesus da cruz. Aqui Jesus não duvidou do amor do Pai por Ele. Mas ter de enfrentar o sofrimento da morte e da cruz doía no mais profundo do coração. Foi com este Jesus humano, que sofre, que Madre Teresa mais se identificou.

O Jesus dos mais pobres

O sofrimento é tanto maior quando pensamos num Deus todo-poderoso, que podia ser mágico e com um estalar de dedos mudar tudo. Mas o Deus de Jesus não é assim. Ele quis precisar de nós, das nossas mãos, dos nossos pés, da nossa boca, do nosso coração para chegar a todos. Madre Teresa viveu este Jesus nos mais pobres, nos que sofrem, nos que ninguém ama nem liga. Isto definia também o carisma do seu trabalho e de todos os que a seguem: não é a magia que salva o mundo, mas o amor.
Era neste Jesus que ela encontrava a força para toda a sua vida de entrega aos outros. E estava segura que Jesus sofredor lhe pedia este testemunho de não se sentir só, mesmo que sentindo a ausência da manifestação de Deus. Escreveu ela numa das cartas ao seu diretor espiritual: «Não, padre, não estou só, tenho a Sua escuridão, tenho a Sua dor, tenho uma terrível nostalgia de Deus. Amar e não ser amado, eu sei que tenho Jesus na união que não foi quebrada, a minha mente está fixa n'Ele e só n'Ele.»

Uma ausência presente

Madre Teresa não via Jesus, parecia-lhe que Ele estava ausente no triste destino dos pobres de Calcutá, mas acreditava que Ele estava lá. Diz ela numa das suas cartas a Jesus: «Jesus, ouve a minha oração, se isso Te agrada. Se a minha dor e sofrimento, a minha escuridão e separação te dá uma gota de consolação, faz comigo o que queiras, todo o tempo que o desejes. Não olhes aos meus sentimentos nem à minha dor.»

Santidade é para todos

O grande exemplo de vida de Madre Teresa em obras de caridade e agora o seu caminho espiritual vem recordar-nos alguns pontos essenciais para a nossa vida de fé como cristãos:
1. Que a vida do cristão não se pode resumir apenas a umas quantas rezas e orações. A vida espiritual em Jesus é um caminho de altos e baixos, um processo nunca acabado de descoberta de Deus na nossa vida. E, ao mesmo tempo, vivida em gestos concretos de amor e caridade.
2. Que não é preciso esperar por uma revelação ou uma intimidade grande com Deus para poder fazer o bem que Jesus pediu. Como dizia Jesus, o Reino de Deus está próximo, como se estivesse à "mão de semear"… (cf. Mc. 1,15). Quem pensar que precisa primeiro de uma fé clara e sem dúvidas para começar a trabalhar pelo Reino de Deus, bem pode esperar sentado porque isso nunca virá.
Madre Teresa será sempre exemplo para nós.

Por: Filipe Resende
Missionário Comboniano
em www.cristojovem.com